sábado, 15 de março de 2014

As crises nas bolsas de 1929 e 2008. Reflexos no Brasil


Data de Publicação: 27 de setembro de 2008
Por José Alberto Couto Maciel
 


Tenho lido sobre o receio de que a crise atual na economia dos Estados Unidos da América possa ter reflexos negativos no Brasil, caso alcance um nível semelhante à crise existente naquele país em 1929.
Alguns gurus da economia brasileira afirmam que esta crise não chegará ao nível do que aconteceu no passado, e políticos de peso relevante, inclusive o presidente Lula, consideram que o Brasil está com uma economia tão estabilizada, que não será prejudicado em razão dos prejuízos econômicos internacionais.
É preciso, porém, melhor analisar o que aconteceu em 1929 e o que está acontecendo agora, porque parece-me que os que falam desconhecem, e os que conhecem não falam.
No início do século XX, os Estados Unidos estavam vivendo um período de prosperidade, sendo que, a partir de 1925, a economia norte-americana começou a passar por sérias dificuldades.Os americanos, com um desenvolvimento elevado na época, passaram a produzir muito, ao mesmo tempo usando das novas máquinas, o que passou a gerar determinado número de desempregados.A produção elevada tinha como objetivo os grandes países europeus, que eram os potenciais compradores dos Estados Unidos, como também, internamente, os produtos eram comercializados com fazendeiros, mediante empréstimos bancários.
Acontece que, após a primeira guerra, os países da Europa entraram em recesso de compras, tendo em vista a sua recuperação econômica, e os fazendeiros não mais obtinham os empréstimos, porque os bancos entraram em crise, diante de uma superprodução sem consumidores.As indústrias, que já iniciavam as demissões de empregados, decorrentes da modernização do parque industrial, passaram a demitir em massa, porque tiveram que reduzir drasticamente sua produção e, em conseqüência, o preço das ações na Bolsa de Nova York despencou, levando à falência bancos, indústrias e empresas rurais, deixando desempregados milhares de norte-americanos.Mas qual o reflexo desta crise no Brasil que alguns têm receio que novamente aconteça, como se fosse ela muito pior do que está acontecendo atualmente?O reflexo da crise de 1929 na economia brasileira, ao contrário do que muitos pensam, não foi prejudicial em seu todo aos brasileiros. Certamente que sofreram os plantadores de café, porque tínhamos os EUA como seu principal comprador, sendo que, com a economia americana debilitada, o preço do produto despencou, gerando uma superprodução e muitos desempregados no setor cafeeiro em nosso país.Em contrapartida, porém, a Grande Depressão acelerou o processo de industrialização, já que os próprios barões do café passaram a aplicar em indústrias, desenvolvendo-as em um país que era em quase sua totalidade ruralista.Assim, é preciso que os economistas que acreditam que o mal maior seria semelhante à crise de 1929, que a esqueçam, pois nada tem ela a ver com o mundo globalizado em que hoje vivemos.Afirmar que o Brasil está preparado nesta época de globalização desenfreada, onde não existem mais culturas próprias de cada povo e nação, onde os valores éticos privilegiam a especulação em detrimento da produção, em um mundo no qual, sentados na televisão, nós, de todos os países, assistimos, em nome da democracia, ao assassinato de crianças e torturas pelo país produtor mais forte, afirmar que estamos preparados para nos manter estáveis enquanto o resto do mundo se desestabiliza, ou é ironia, ou ignorância...O que há, atualmente, é uma mundialização da economia, sendo que nações economicamente auto-suficientes tendem a desaparecer. Vivemos em um mundo no qual o presidente de uma grande multinacional tem maior relevância do que o político mais importante de um país, sendo que os executivos, em nível mundial, acumulam muito mais poder do que os políticos defendendo sua nação.
Os direitos sociais, atualmente, transformam-se em mercadorias e as conquistas dos trabalhadores devem ser flexibilizadas, porque as grandes empresas ingressam com o capital que interessa a determinado país, se nele o preço do trabalho for insignificante; e daí vemos os tênis, as calças jeans, e produtos mais vendidos mundialmente, com as etiquetas “made in China”, ou “made in Corea”, ou em outros países explorados.
Sabemos que hoje, pelo trabalho terceirizado, empresas americanas contratam escritórios de contabilidade na Índia para que façam seus serviços durante a noite, e por um preço irrisório de mão-de-obra.
Enquanto o Sheik constrói em Dubai, a cidade mais moderna do mundo, indianos e paquistaneses trabalham para tanto 24 horas por dia, ao sol de 50 graus, dormindo em cubículos no deserto com 10 a 20 pessoas, recebendo um salário de US$ 200 mensais, sem qualquer garantia, a chamada flexibilização. Vejam que a globalização não é só na economia, como também integra a pobreza, porque os países mais industrializados, ou que possuem, por força do petróleo, riquezas fantásticas, como os Emirados Árabes, não pensam em melhorar o nível social dos mais pobres, mas em escravizá-los, uma escravidão nova, globalizada.
Dentro desta aldeia global em que vivemos, afirmar que uma das maiores crises econômicas em Wall Street, que afeta o resto do mundo, não afetará o Brasil, é tentar passar para o povo brasileiro um otimismo no caos, uma vez que estamos todos no mesmo barco.Seria interessante dar um exemplo, para se ter uma idéia prática do que é a globalização e seus efeitos imediatos nos demais países. As conseqüências no mundo globalizado podem decorrer de um sistema que se tornou instável, ou de uma prática aleatória, o que alguém chamou de Teoria do Caos.Houve uma explosão em um oleoduto na Nigéria e os preços das ações do ramo petrolífero dispararam, ganhando os apostadores na bolsa de valores milhares com as ações relativas às empresas petrolíferas.Mas a explicação para este desastre, e aqui vem o interessante exemplo do caos predominando sobre os mercados do mundo: um trabalhador da escavadeira, cansado porque teria dormido mal, perfurou o oleoduto, causando a explosão; ou seja, aquele nigeriano, cansado, afetou o mundo por um dia inteiro.Tudo isso serve para prevenir os brasileiros de que uma crise de 2008 na bolsa de valores de Nova York certamente influenciará, sim, a nossa economia, e devemos estar prevenidos, até mesmo porque um operário, com uma noite mal-dormida, poderá trazer, de um momento para o outro, noites mal-dormidas para todos nós no mundo, inclusive para o nosso presidente, tão otimista.
Disponível em: <http://www.brasiliaemdia.com.br/2008/9/25/Pagina5382.htm>. Acessado em 12/10/2008 

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