sábado, 27 de outubro de 2012

O fim da farsa


Biografia do guerrilheiro Carlos Marighella desmonta a versão oficial do assassinato do militante comunista e confirma reportagem de ISTOÉ

Alan Rodrigues

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PÁGINAS HISTÓRICAS
Dividido em 43 capítulos, o livro-reportagem discorre
sobre os tropeços e triunfos do ex-líder da ALN
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O regime militar instalado no Brasil em 1964 e que se manteve no poder por mais de 20 anos deixou um saldo macabro de 475 mortos – 163 deles ainda desaparecidos. Entre os militantes assassinados nos anos de chumbo está o guerrilheiro Carlos Marighella, líder da Ação Libertadora Nacional (ALN), cuja história da morte, em 1969, sempre esteve envolta em mistérios. A versão oficial dá conta de que o guerrilheiro foi abatido dentro de um automóvel depois de sacar uma arma e resistir à prisão. Logo em seguida, ainda de acordo com essa versão, teria acontecido um tiroteio entre as forças públicas e seguranças da ALN, que resultou na morte de outras duas pessoas.

Agora, depois de mais de quatro décadas, o jornalista Mário Magalhães contraria tudo o que já foi publicado sobre o caso. Em “Marighella, o Guerrilheiro Que Incendiou o Mundo” (Companhia das Letras), o autor desmonta a tese oficial ao revelar que Marighella estava desarmado ao ser morto dentro do carro. O jornalista ainda conta na publicação que a troca de tiros entre os policiais e os guerrilheiros nunca aconteceu, pois Marighella estava sozinho. Entre as 588 páginas da obra, Magalhães revela que o ex-deputado comunista não andava armado. Tampouco escoltado por seguranças. “Foi fogo amigo”, afirma Magalhães no livro.

Sua convicção está amparada em uma investigação rigorosa com 256 pessoas entrevistadas em nove anos de pesquisa. Ao desmontar a farsa da morte de Marighella, o livro confirma reportagem de ISTOÉ, publicada em março, que revelou o teatro montado pelos policiais para esconder como de fato foi assassinado o líder da ALN. “Eu vi os policiais colocando o corpo do Marighella no banco de trás do carro”, afirmou o fotógrafo Sérgio Vital Jorge.

Temido por sua valentia e coragem, Marighella era considerado o inimigo número 1 dos militares. Perseguido pelas forças de repressão nacional e monitorado tanto pela agência de inteligência americana CIA como pela russa KGB, Mariga, como era tratado pelos amigos, foi um dos mais destacados revolucionários do século XX. Os policiais tratavam-no como o Che Guevara nacional. Entre as passagens da vida do guerrilheiro contadas pelo autor, chama a atenção um paradoxo: Marighella não acreditava no triunfo da guerrilha na cidade, mas, sim, que as ações urbanas estavam fadadas ao fracasso. “Pouco antes da morte, ele preparava-se para ir para o meio rural”, diz Magalhães.
Para esquadrinhar os passos de Marighella, o autor debruçou-se sobre mais de 600 títulos, além de garimpar material em 32 arquivos públicos e privados espalhados pelo País. Em um dos 43 capítulos, ele mostra, por exemplo, que o chefe da ALN teve que se tratar com remédios e sessões de análise quando se tocou de que o líder russo Josef Stalin era um engodo. A publicação revela também o lado romântico do guerrilheiro, a partir dos conflitos da paixão, ciúmes e agruras de uma vida em sobressalto. “Chequei obsessivamente cada versão, sabedor das traições e idiossincrasias da memória”, afirma Magalhães. “O livro não promove o personagem principal da história, ou é um libelo de oposição a ele. O trabalho é uma reportagem que escrutina seus triunfos e tropeços, grandezas e pequenezas, os altos e baixos próprios da espécie humana”, diz Magalhães.

Disponível em: http://www.istoe.com.br/reportagens/249045_O+FIM+DA+FARSA



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